Rumpelstiltskin e a Idolatria

10:40



Algum tempo, em um dia extremamente entediante, resolvi assistir “Shrek Para Sempre” só para escutar a minha música favorita (Top of the World – The Carpenters). Porém, uma figurinha interessante chamou-me atenção como nunca antes: o Rumpelstiltskin.

No filme, Shrek estava saudoso. Ele tinha uma nova rotina (a vida de casado e de pai) e teve que abrir mão de toda a sua liberdade "de solteiro" e "sem filhos". Por causa disso, sentia falta de quando era temido por todos e de quando vivia sozinho no pântano.

Ao reparar isso, um pequeno duende chamado Rumpelstiltskin aparece com a proposta de solucionar os seus problemas: Shrek teria um dia como um “ogro de verdade” e, em troca, Rumple pediu “apenas um dia”. 

Para os que não conhecem a estória do Rumple: ele é um negociador traiçoeiro que costuma sempre aparecer nos momentos mais convenientes – na maioria das vezes, quando alguém precisa muito de algo. Ele faz propostas que parecem “salvar a vida” de uma pessoa necessitada, pois ele realmente realiza os seus desejos.

Porém, os que lembram do Rumple em Shrek, na série “Once Upon a Time”, ou até mesmo conhecem o conto original, sabem que essas negociações sempre exigem preços muito altos.

Analisando o Rumple como nunca antes, notei algo que sempre passou despercebido por mim, e acredito que por muita gente: O Rumpelstiltskin é a personificação da idolatria. 

Desde a Queda no Éden, o homem – agora naturalmente pecador – não quer mais saber do seu Criador; Ele não mais deseja um Senhor soberano ditando o que deve ou não fazer. A serpente conseguiu convencê-lo a tornar-se “semelhante” a Deus, logo, não mais submisso ao mesmo.

A imagem de Deus no homem foi manchada, porém não apagada. O fim supremo e principal dele ainda é glorificar ao seu Criador e gozá-lO para sempre (BCW 1). Portanto, diferente do que pensou que aconteceria ao pecar, o homem continuou sendo um ser religioso, isto é, feito para relacionar-se com uma divindade.

Mas por causa do seu estado natural, passou a construir para si ídolos na tentativa de suprir esse vazio existencial advindo da Queda. Como disse bem João Calvino, o coração do homem pós-Queda tornou-se uma  "máquina de fabricar ídolos".

Quando lembro do Rumpelstiltskin e de seus contratos, é impossível não vê-lo mais como a personificação da idolatria.

Assim como o Rumple, a idolatria sempre aparece em momentos convenientes oferecendo-nos alguma coisa para nos conquistar. Ao longo da vida, nossos ídolos ruem e quebram-se, pois a verdade é que não tem em si poder algum. E quando isso acontece, parece que quebramos e caímos em ruínas junto com eles, pois nos tornamos semelhantes a aquilo que adoramos (Sl 115). Por adoramos ídolos vazios, de igual modo vazios nos tornamos pois buscamos ser e ter tudo aquilo que eles nos tem a oferecer.

É justamente no momento em que nossos ídolos são confrontados e quebrados, que não mais servem para satisfazer-nos, que a idolatria vem como Rumpelstiltskin e nos oferece um novo negócio, um "contrato novo", com algo capaz de nos satisfazer muito mais do que aquilo que perdemos. Por estarmos cegos pelos nossos pecados, acreditamos de fato que o que nos é oferecido pode resolver os problemas que surgiram.

Felizes, então, assinamos um novo contrato com a idolatria.

Assim como Shrek, quando assinamos esse contrato realmente nos sentimos bem. Podemos até ouvir “Top of the World” de fundo. Realmente nos sentimos no topo do mundo e parece que está tudo bem. A gente só esquece que todo ídolo cobra algo em troca e o que nós iremos oferecer? Isso depende. Mas uma coisa é fato: o que iremos oferecer a curto prazo, parece não ser nada demais. E nós, cegos, realmente acreditamos nisso.

Para que as coisas não fiquem muito abstratas, irei exemplificar:

Se o nosso deus é o dinheiro, faremos de tudo para que ele nunca nos falte. Porém, para obtê-lo, somos obrigados a sacrificar algumas coisas que são importantes.

No início, quando ainda estamos na escola, achamos que só precisamos abrir mão de algumas horas no celular ou algumas horas com nossos amigos. Em certos momentos isso até parece bom, até porque parece que nos livramos de outro de nossos ídolos: o celular. Mas como todo ídolo, o preço não é baixo.

Depois do segundo ano estudando para o vestibular achamos de devemos sacrificar alguns domingo para assistir algumas aulas no cursinho. A idolatria finalmente nos dá aquilo que queríamos e finalmente entramos na faculdade. Lá o nosso tempo é ainda mais reduzido.

Chega uma hora que temos estágios e faculdade. Não paramos em casa e nossa vida é na rua. Só chegamos em casa tarde da noite. Se acha que acabou, mesmo depois disso o preço continua aumentando.

Passamos sacrificamos o momento que temos com nossa família, uma alimentação saudável, e por que não o nosso momento devocional? Como chegamos tarde da noite, e temos um ídolo para sustentar, não vamos dormir. Precisamos estudar, afinal, eu temos que ir muito bem nas provas para que isso melhore o meu currículo, mesmo que isso me tire o tempo de ler as Escrituras e orar ao Senhor. Sem notar, sacrificamos também a nossa saúde. 

“Eu preciso ser responsável”, “É o único tempo que eu tenho”… Reproduzimos e criamos as mais diversas e convincentes desculpas para justificar, defender, o ídolo que escolhemos para nós. 

No fim de tudo, porém, olharemos para todos os lados e nos veremos como o Thanos no fim de “Os Vingadores: Guerra Infinita”. Quando ele consegue todas as Joias, Gamora pergunta: “O que isso te custou?”. Ele responde: “Tudo”.

No final de nossas vidas, nossos ídolos nos deixam sós. Eles levam tudo de mais precioso que o Senhor nos deu. Além disso, eles cobram de nós o maior sacrifício de todos: nosso tempo diante do Senhor.

Concluindo: assim como Rumpelstiltskin, a idolatria nos faz propostas e promessas que parecem fáceis e simples, jurando-nos que possui um caminho direto e sem rodeios para nossa satisfação. Porém, o preço é altíssimo: a completa rebeldia contra Deus, pois somos obrigados a colocar o ídolo em um lugar que pertence unicamente ao Criador. Além disso, mente para nós, pois a verdade é que a única coisa que pode verdadeiramente nos dar plenitude de vida é o amor de Deus e a obediência à Sua vontade.

Clamemos ao Senhor diariamente que nos liberte da nossa escravidão, e nos transforme segundo a imagem de Cristo Jesus, aquele que viveu e suportou todas as ofertas do Maligno (Mt 4.1-11) — mas se entregou a nós como sacrifício sem que pudéssemos ofertar nada em troca. Além disso, busquemos sempre manter-nos próximos do Senhor, lendo Sua Palavra e falando a Ele através de orações, para que no dia mau, quando o novo ídolo for oferecido, estejamos despidos do velho homem e fortalecidos em Deus.

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1 comentários

  1. Nunca tinha visto o Rumple dessa maneira. E, Deus, como eu previsava disso. De fato, o texto é digno de estar aqui, Joy. Deus te abençoe e nos ajude contra esse pequeno (tamanho dele no filme) grande pecado.

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